No apontamento anterior, reproduzimos a correspondência do comerciante filatélico William Brown, sediado em Londres, solicitando os bons ofícios do Ministério do Ultramar para clarificar as suas dúvidas quanto à legalidade dos selos emitidos pela Companhia do Niassa. Não encontramos nenhuma correspondência, arquivada no Arquivo Histórico Ultramarino, dando resposta àquela solicitação.
Porém, encontramos uma outra correspondência relacionada com a temática. O comerciante filatélico londrino de nome Harry Hitches & C.º remeteu uma carta ao Ministro dos Negócios Estrangeiros na tentativa de obter uma resposta sobre a legalidade dos selos que a Companhia do Niassa vinha vendendo em Londres. Como não era matéria sobre a qual aquele Ministério, pudesse emitir opinião abalizada, foi a carta do comerciante remetida anexa por ofício de 2 de Maio de 1895 para o Ministério do Ultramar solicitando a desejada informação. O teor do ofício era o seguinte:
“Por ordem de Sua Ex.ª o Ministro e Secretário d’Estado desta repartição tenho a honra de enviar a V. Ex.ª, a fim de que V. Ex.ª se sirva leval’a ao conhecimento de Sua Ex.ª o Ministro dos Negócios da Marinha e Ultramar, o incluso documento com respeito à emissão de estampilhas postaes feita, segundo se affirma pela Companhia do Nyassa.”
A carta do comerciante não se encontra no Arquivo Histórico Ultramarino, porque pelo que se apurou terá sido enviada para a Procuradoria-Geral da Coroa integrando um processo sobre a Companhia do Nyassa.
Para dar resposta a este assunto, foi encarregue a 2.ª Secção da 3.ª Repartição da Direcção Geral do Ultramar, que em 6 de Maio de 1895, redigiu a seguinte informação para ser presente ao Ministro da Marinha e Ultramar:
Vila do Ibo - Correios e Alfândega cerca de 1906 |
“A Direcção dos Negócios Estrangeiros remeteu a este Ministério a carta inclusa de Harry Hitches & C.º, de Londres, dirigida por esta firma ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, queixando-se de que a Companhia do Nyassa vendeu a differentes negociantes e colleccionadores várias estampilhas que, no entender do signatário, são falsificações.
Pergunta por isso o seguinte:
1.º - Se a Companhia do Nyassa está autorizada a emittir as suas estampilhas e em que condições;
2.º - Se as estampilhas impressas e vendidas em Londres são reconhecidas como boas pelo Governo Portuguez.
Ao primeiro d’estes pontos convem responder para o Ministério do Estrangeiro que por decreto de 21 de Novembro do ano passado foi autorizada a circulação nos territórios da Companhia do Nyassa de papel sellado, sellos e estampilhas postaes emittidos pela Casa da Moeda tendo a legenda “Companhia do Nyassa” sendo, porém, todas as fórmulas de franquia sujeitas à approvação do Governo e não poderão ser alteradas essas fórmulas sem prévia autorização do governo.
Tendo a Companhia enviado para o Ministério da Marinha vários specimes de fórmulas de franquia não foram reputados dignos de approvação, officiando-se ao Comissário Régio para que viessem em devida forma. Até agora não tinham sido remettidos novos specimens e por isso devem considerar-se falsificados os que foram vendidos em Londres.
Ficam assim respondidas as duas perguntas, contidas no offício de Harry Hitches & C.º, que convém enviar à Procuradoria Geral da Coroa com o processo da Companhia do Nyassa.
6/5/95
(a) Oliveira Pires.
Vila do Ibo - Residência do Governador da Companhia do Niassa |
Parece-nos que neste processo a 3.ª Repartição demonstra ambiguidade nas duas informações que prestou (na agora proferida e na apresentada no primeiro apontamento sobre este tema). Na primeira informação em que rejeita os espécimes apresentados pela Companhia do Nyassa diz, sucintamente, que os símbolos da soberania portuguesa não estão representados nos selos, mas nada alega sobre a obrigatoriedade dos selos serem emitidos pela Casa da Moeda e muito menos da existência ou não de uma legenda “Companhia do Nyassa”.
Na informação agora produzida, alega precisamente essas duas obrigatoriedades para considerar os selos como falsificações. Não é hoje possível saber-se qual o conceito de “falso” do funcionário Oliveira Pires, responsável por esta informação. O certo é que o Ministro da Marinha e Ultramar teria um conceito diferenciado de “falso”, pois pelo seu punho lavrou o seguinte despacho na informação apresentada: “Responda-se ao Ministro do Estrangeiro conforme esta informação considerando porém a emissão de sellos de illegal. 6/5/95” a) assinatura ilegível.
A posição política, sobre esta emissão, é clara quando o Ministro do Ultramar considera esta emissão como ilegal. Entretanto já aparecem dois conceitos distintos dentro do Ministério do Ultramar: falsos e ilegais.
Bibliografia
· Cota S/N.º 2G SEMU DGU Cx 1895 Companhia do Niassa, AHU
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