A Companhia de Moçambique foi fundada em 1891 pelos Decretos de 11
de Fevereiro e 31 de Julho com direitos de soberania delegados pelo Governo
Português, e tinha como finalidade a exploração de territórios que lhes foram
concessionados em Moçambique, coincidentes com os territórios de Manica e
Sofala.
A constituição da Companhia de Moçambique tinha em mente por parte
do Governo Português a neutralização da influência da British Central Africa,
para além de promover o desenvolvimento da região concessionada.
A Companhia, para além dos vastos poderes que detinha para
explorar o território, também estava investida de poderes para emitir moeda,
assim como valores postais e fiscais. A administração do serviço postal também
passou a ser assegurada pela Companhia de Moçambique. SARL, tendo-se-lhes sido
concedida autorização para a emissão de selos postais por decreto de 8 de
Agosto de 1892, publicado no Diário de Governo n.º 177 de 9 de Agosto, sendo
obrigatória que a sua produção fosse assegurada pela Casa da Moeda e Valores
Selados em Lisboa, e que esses selos contivessem a legenda “Companhia de
Moçambique”.
A instalação dos serviços de correio, pela nova entidade
administrante, não foi instantânea pelo que muito dos serviços e dos processos
administrativos numa primeira fase terão sido executados de modo artesanal e
provisório.
Isto mesmo está evidenciado na carta que apresentamos na Figura 1
onde podemos observar dois ou três aspectos característicos do serviço de correios
ultramarinos e da peculiaridade da vivência ultramarina no século XIX.
O primeiro aspecto tem a ver com a ideia transmitida de que todo o
indivíduo era conhecido em África. Um endereço contendo o nome do destinatário
e um endereço vago de “British Central Africa” deveria ser suficiente para ser
entregue a correspondência.
British Central África era um protectorado inglês instalado nos
Distritos da Niassalândia. Inicialmente, em 1889, os territórios da região
conhecida por Shire Highlands a sul do Lago Niassa tornaram-se num protectorado
inglês, em resposta à crise anglo-portuguesa sobre o controlo dos territórios
junto ao Lago Niassa. Em 1891 os ingleses estenderam a sua zona de controlo dos
territórios por todos os Distritos da Niassalândia e transformaram em 1892 o
antigo Protectorado do Shire Highlands em Protectorado da British Central
África.
Mapa parcial da BCA e Moçambique |
Blyntire transformou-se no centro económico e cultural do
protectorado enquanto o centro administrativo ficava em Zomba, onde residia o
Governador. Em 1907 o Protectorado passou a denominar-se da Niassalândia.
Feitoria da Beira, na margem do Rio Xiveve |
Nos termos da Convenção de 11 de Junho de 1891 o Governo português
concedeu aos ingleses um terreno no Chinde para aí serem construídas
instalações da British Central África que facilitassem a armazenagem e
transbordo de mercadorias a si destinadas, ou por ela enviadas dos seus
territórios. Estrategicamente, o Chinde, era vital pelas facilidades que
proporcionava ao trânsito de mercadorias e pessoas. Ainda nesse terreno os
ingleses acabaram por instalar uma estação postal sob sua égide, prestando
todos os serviços postais, em concorrência com a estação postal portuguesa
também criada no Chinde.
Depois desta resenha histórica e voltando ao tema central, a carta
referida foi simplesmente endereçada a um indivíduo na British Central África,
sem mais qualquer elemento que ajudasse ao seu encaminhamento. Foi remetida de
Grantshouse em 14.10.1892 e recepcionada na Beira em 23.11.1892, onde caiu em
refugo por não ter sido reclamada e por ser provavelmente desconhecido o
destinatário. Cabe agora colocar a questão de se procurar saber do motivo
porque a carta não foi enviada para o Chinde, onde mais facilmente poderia ter
sido encontrado o destinatário. Como à data não existia marca específica de
refugo, a indicação de aí ter caído foi manuscrita. Parece-nos também que nesta
data a estação postal da Beira ainda não possuía marcas indicadoras dos motivos
da devolução das correspondências, tais como: DESCONHECIDO /INCONNU, DEVOLVIDO
AO REMETENTE, etc. Como também podemos verificar estamos no momento em que a
recém-criada Companhia de Moçambique dava os seus “primeiros passos”.
Provavelmente esta será a mais antiga carta conhecida, quer seja destinada, ou
remetida dos territórios da Companhia de Moçambique.
Como se pode constatar pelo carimbo inglês batido no verso, a
carta acabou por ser devolvida aos correios ingleses sem a indicação do motivo
por que não foi entregue. Na ausência das marcas normalmente usadas, essa
indicação deveria ter sido manuscrita.
Na figura 2 podemos apreciar uma outra carta (por cortesia do meu
amigo Altino Pinto), datada do ano de 1900, em que a estação postal da Beira já
era detentora de marca específica para carimbar as cartas caídas em refugo,
assim como das marcas identificadoras dos motivos porque não foi entregue a
correspondência.
Carta
remetida para Durban e reexpedida para a Beira (28.03.1900). Não tendo sido
reclamada e por ser desconhecido o destinatário caiu em REFUGO (??.04.1900).
Circulada durante o período da guerra Anglo-Boer foi censurada com cinta de
fecho laranja. A guerra
Anglo-Boer começou em 12 de Outubro de 1899. Marcas administrativas batidas a
preto “INCONNU / DESCONHECIDO” e “NON-RECLAMÉ / NÃO RECLAMADO”, todas aplicadas
na estação postal da Beira.
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