Em Junho de 2001 publiquei um artigo
intitulado História Postal de Angola (9) * Estação Postal do Dundo, no Boletim
do Clube Filatélico de Portugal n.º 392, através do qual procurei historiar
sobre o nascimento e vida daquela estação postal. O que ali escrevi mantêm-se
actual, porém agora venho acrescentar algo mais sobre a história do serviço
postal na área de influência da Diamang.
Como naquela data escrevi, em
consequência da descoberta de campos diamantíferos no ex-Congo Belga, pela
Société Internacionale Forestière et Minière du Congo, ao longo do leito do Rio
Cassai e seus afluentes, fundou-se em 12 de Setembro de 1912 a Companhia de
Pesquisas Mineiras de Angola (PEMA), com o objectivo de averiguar sobre a
existência ao não de diamantes, na parte hidrográfica pertencente a Angola e
contínua aos vários tributários do Rio Cassai.
A Companhia tinha como sócios
fundadores o Banco Nacional Ultramarino e a firma Henry Burnay & Cia (mais
tarde denominada Banco Burnay) de Portugal, a Société Général de Belgique e a
Mutualité Coloniale da Bélgica, o Banque de l´Union Parisienne da França e o
grupo Ryan-Guggenheim dos E.U.A.. Em 1913 impulsionada pelo General Paiva de
Andrade e Dr. Baltazar Cabral obteve a Companhia uma concessão legal para fazer
pesquisas na Lunda. Os trabalhos de pesquisa seguiram em bom ritmo com o apoio
da congénere belga, sendo as perspectivas tão boas, que permitiram comprovar a
existência de um rico campo diamantifero na Lunda, o que levou em 1917 à constituição
da DIAMANG - Companhia de Diamantes de Angola, filial da Companhia de Pesquisas
Mineiras de Angola, destinada à exploração.
Vagonetes para o transporte do minério |
Em 1920 foi negociado um contrato de
exploração entre a Diamang e o Estado, pelo qual, aquela ficava com o direito
por tempo indefinido às minas descobertas e de todas aquelas que demarcasse até
ao ano de 1951, enquanto que ao Estado eram oferecidos 5% do capital social
desta empresa, e o direito a receber 40% dos lucros líquidos que ela gerasse.
Posteriormente, em 1954, foi renegociado o contrato anterior, passando o
Governo da Província de Angola a ter direito a 50% dos lucros líquidos.
A Diamang vai dinamizar todo o
nordeste de Angola, e a sua obra é impar em todos os seus aspectos, mas
principalmente dela resultam grandes benefícios quer na economia quer na
ocupação nacional da Província. O que foi feito na Lunda, sob todos os pontos
de vista, é uma obra de larga visão e projecção socio-económica na vida de
Angola.
Porém a Diamang vai exercer um
controlo quase que discricionário sobre a região abrangida pelo contrato
firmado com as autoridades portuguesas. O Dundo e Vila Paiva de Andrada
constituíam os dois maiores núcleos populacionais do nordeste da Lunda. A
população residente era constituída quase na sua totalidade por empregados da
Diamang, de tal forma que por Portaria n.º 753 de 9 de Abril de 1931, o então
Governador-Geral de Angola, José Dionísio Carneiro de Sousa e Faro manda
eliminar aquelas duas povoações do “Mapa das povoações existentes e sua
classificação”, devendo os seus terrenos ficarem integrados nas concessões de
terrenos, feitas à Companhia de Diamantes de Angola. Alegava-se que ambas eram
povoações de natureza particular.
Portaria n.º 753 |
Tanto assim é, que a estação postal
e telegráfica do Dundo foi montada pela Diamang e a generalidade do seu
movimento tinha como origem o serviço da Diamang e dos seus trabalhadores.
Há muito tempo que tinha uma quase
certeza de que deveria existir um serviço postal instalado pela Diamang nos
territórios a si concessionados, porém tendo em conta os regulamentos postais
que determinavam ser o serviço postal um monopólio do Estado, tinha uma certa
relutância em admitir a existência desse serviço postal particular.
Vista aérea do Dundo |
Porém, há cerca de um ano, tive a
rara oportunidade de adquirir, num leilão da Ebay, uma espectacular carta que
veio confirmar as minhas suspeitas.
A carta (Fig.1), franquiada com selo
de 1F75, é remetida por via aérea da Bélgica * Hoirefontaine (22.08.1941) para
o Dundo com trânsito por Elizabethville (12.09.1941) e Tshikapa (15.09.41). Foi
censurada pelos alemães e depois pela censura belga em Elizabethville.
Provavelmente, sendo o destinatário Emile Gratia, funcionário da Diamang e não
se encontrando nesse momento no Dundo a carta foi remetida sucessivamente pelos
serviços de correio da Diamang para Maludi (20.09.41) e para Andrada (Vila
Paiva) (22.09.1941).
Figura 1 |
Os dois carimbos têm a mesma
morfologia e são compostos por três rectângulos agregados formando um outro
rectângulo medindo 38mmx26mm.
Foi um carimbo desta tipologia que
durante os anos de 1935 a 1936 serviu como marca obliteradora na estação postal
do Dundo conforme se pode ver pela carta da figura 2. Para não ser muito
chocante a utilização da marca original encimada pela palavra DIAMANG numa
estação postal, que se presumia ser estatal, esta foi limada. O carimbo mede
38mmx17,5mm exactamente a mesma medida dos dois rectângulos inferiores dos
carimbos de MALUDI e ANDRADA.
Mapa |
Estranha-se o facto de a carta não
ter sido obliterada com o carimbo da estação receptora (DUNDO). Será que de
Tshikapa as cartas eram enviadas directamente para a Diamang? É uma
hipótese!!!...
Esta última
(Fig. 2) carta tem sido para mim uma incógnita. Foi remetida registada por via
aérea do Dundo (14.09.35) para Bruxelas, com trânsito por Tshikapa (16.09.35),
Luluabourg (19.09.35), Port-Franqui (21.09.35) e Conquilhatville (22.09.35),
onde apanhou a ligação aérea da Sabena para Bruxelas via Stanleyville. Pagou de
porte 24$05. Conhecendo-se o peso da carta (38gr manuscrito no canto superior
esquerdo) podemos desde logo tentar decompor o porte: 1$75 pelo 1.º porte do
correio ordinário (até 20 gr) + 1$00 pelo segundo porte (21 a 40 gr) + 2$00
pelo prémio de registo, restando 19$30 para o porte aéreo.
Figura 2 |
Pelas tarifas conhecidas do correio
aéreo a cada 5gr corresponde um porte, assim esta carta teria de pagar uma
franquia correspondente ao 8.º porte. Nesta data Angola ainda não tinha tabelas
para correio aéreo aprovadas e em execução. A primeira tabela de correio aéreo
foi publicada em 24 de Junho de 1936. Por que tabela, ou por que critério foi
franquiada esta carta? Por agora não consigo interpretá-la. Pode ser que o
tempo se encarregue de deslindar esta incógnita. Por ora fico a aguardar que
apareça alguma legislação que justifique esta franquia.
Atendendo à falta de regulamentação
sobre o trânsito de correspondências por via aérea, durante anos foi norma na
estação postal do Dundo a opção pela franquia mista, quando se pretendia fazer
seguir as cartas por essa via. Aproveitando o preceituado na alínea c) do parágrafo
1.º do Art.º 3.º do Regulamento dos Correios Ultramarinos de 11 de Dezembro de
1902, que permitia o transporte por particulares de cartas, cartões postais,
bilhetes postais e processos judiciais que já tenham sido franqueados e
carimbados nas estações postais do lugar de procedência, os objectos postais
eram apresentados franquiados na estação postal do Dundo, de acordo com as
tabelas de porte em vigor, obliteradas e entregues ao portador para seguirem em
mão. Eram transportadas até ao Tshikapa, a cargo da Diamang que facultava uma
carrinha para esse efeito, onde eram apresentadas nos correios belgas para
seguirem por via aérea, pagando-se o porte devido pelo serviço. É certo que as
cartas estavam sujeitas a uma aumento significativo do porte, porém tinham como
vantagem poderem seguir num meio de transporte mais rápido, ganhando-se uma
vantagem significativa em relação ao meio de transporte tradicional (via
terrestre e marítima).
Figura 3 |
Na figura 3 apresentamos um exemplo
desta forma de circulação de correspondências. A carta foi remetida do Dundo
(07.02.31) para Leopoldville (16.02.31) com trânsito por Tshikapa (13.02.31).
Pagou no território português a franquia de 1$40 (1.º porte do correio
ordinário para o estrangeiro * cartas com peso até 20 gr * Decreto 18.467 de
16.06.1930). No Congo Belga foi franquiada com 1$50 (1.º porte da sobretaxa do
correio aéreo).
A estação postal do Dundo,
provavelmente por ser quase que uma estação particular, esteve durante muitos
anos privada de um carimbo próprio para obliteração das correspondências.
Conhecem-se várias marcas provisórias e de recurso. A utilização de um datador
como marca obliteradora, foi uma das utilizadas durante um largo período.
Bibliografia
·
Boletim Oficial de Angola
·
Correia (2001) – Boletim CFP 392
Junho 2001
·
Eduard Proud (2010) –
Intercontinental Airmails, Volume Three, África
·
Roger
Gallant (2005) – Histoire du Service Postal au Congo Belge (1886-1960), Tome I
Muito interessante! Obrigada!
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